ANASPS/ON LINE/Extra
Informativo
Semanal Temático da Diretoria Executiva da ANASPS
Ano XVIII, Edição nº 1.454
Brasília, 19 de Fevereiro de 2016.
O pensamento do ministro Rossetto sobre a reforma da Previdencia.
Desvincular mínimo da Previdência não está em pauta, diz Rossetto
VALOR ECONÔMICO – SP , Edna Simão e
Ribamar Oliveira | De Brasília, 15.02.2016
Apesar das resistências de seu próprio partido, o PT, e das
centrais sindicais, o ministro do Trabalho e Previdência
Social, Miguel Rossetto, aposta no diálogo para alcançar "pontos de
convergências" que permitam a reforma da Previdência
Social, a partir do Fórum criado para discutir o assunto e que se reúne
nesta quarta-feira. A expectativa de Rossetto é que governo consiga chegar a
uma proposta com os diversos interlocutores até o fim deste semestre.
Em entrevista ao Valor, Rossetto
deixou claro que a desvinculação dos benefícios previdenciários do reajuste do
salário mínimo não estará na mesa de negociação. Para o ministro,
"preservar o salário mínimo como piso previdenciário é uma das referências
estratégicas da reforma". Ele lembrou que a política de reajuste do
salário mínimo "está resolvida" até 2019. Vários especialistas
consideram que a repercussão do aumento real do mínimo sobre os benefícios
previdenciários é uma das principais razões do desequilíbrio do sistema.
Rossetto ressaltou que não há uma
posição "concluída" no governo com relação à fixação de idade mínima
para requerer aposentadoria. O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, defende uma
idade mínima de 65 anos. Essa é, segundo Rossetto, uma opinião de Barbosa,
entre várias outras que existem no governo.
Mas tudo, conforme o ministro,
está em discussão, como a equiparação das regras de concessão de aposentadoria
para homens e mulheres, assim como as dos trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos e dos trabalhadores da área urbana e
da rural. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Valor: No atual quadro político,
de grandes dificuldades do governo no Congresso, o senhor acha possível avançar
em uma reforma da Previdência Social?
Miguel Rossetto: Seguramente em
alguns pontos. Este é um tema relevante para o governo. A presidente Dilma
Rousseff tem sinalizado claramente a importância deste debate, que transcende o
interesse de governo de curto prazo. Nós temos que entender que esta (a questão
previdenciária) é uma agenda permanente e tem sido tratada assim pelo Congresso
Nacional ao longo dos anos.
Valor: Mas as resistências são
grandes?
Rossetto: Penso que o país tem
maturidade, como tem demonstrado ao longo de todos esses anos, para enfrentar
esse tema preservando duas referências estratégicas. A primeira delas é
preservar um modelo de previdência solidário, de repartição simples, de caráter
contributivo e com contribuição de impostos, que é uma experiência positiva
para o país. A segunda é a preservação do salário mínimo como piso
previdenciário importante. A manutenção do poder de compra dos benefícios
previdenciários, de um modelo solidário de previdência, de repartição simples,
que é o regime geral, que ao lado do regime próprio dos servidores, se
constituíram nesse grande patrimônio de seguridade para os brasileiros. O
regime geral concede 28 milhões de benefícios previdenciários anuais e possui
51 milhões de contribuintes. Por isso, a reforma é um tema a ser tratado com
serenidade, com responsabilidade e com sobriedade.
Valor: Vários líderes importantes
do PT já se manifestaram contrários à reforma da Previdência, assim com líderes
da base aliada. Como avançar na reforma em ano de eleição municipal? A posição
do PT não é um obstáculo à reforma?
Rossetto: O partido tem debatido e
vai debater este tema. Como todos os partidos da base aliada e o Congresso
Nacional. Nós estamos abrindo esta agenda. É evidente que, para nós, o resultado
dessa agenda não pode se traduzir unicamente em mais conflito. Esta tem que ser
uma agenda de convencimento, de informação sobre o sistema. Eu acredito na
nossa capacidade de construção de acordos importantes. Vamos construir uma
agenda ampla, de diálogo, que significa escutar. Tenho absoluta confiança,
segurança, que as centrais sindicais, o setor empresarial, os partidos
políticos têm muito a contribuir e vão oferecer sugestões em cima de um roteiro
básico para assegurar aquilo que é uma referência para o governo: preservar uma
Previdência solidária, justa para todos.
Valor: No passado, as mudanças na
Previdência eram feitas sempre no início do mandato do presidente, com um
governo forte, algo muito diferente do que vivemos hoje. Ainda não sabemos se
vai haver ou não impeachment. Qual é a estratégia do governo para conseguir
esse convencimento em torno das mudanças da Previdência?
Rossetto: Do ponto de vista
político, é correto o tema que vocês trazem. Por isso a importância do diálogo,
do convencimento, da convocação para que todos esses atores e essas
representações políticas participem dessa agenda, manifestem sua opinião sobre
essa agenda. Exatamente por conta dessa situação delicada, sensível, é que nós
temos que trabalhar em um ambiente de convencimento.
Valor: Mas o governo não tem esse
ambiente de convencimento hoje.
Rossetto: É por isso que vamos
trabalhar de uma forma dedicada, com números, com dados, com atualização da
estrutura previdenciária, das condições demográficas do país, estimular de uma
forma forte esse ambiente que é de responsabilidade comum. Teremos pontos de
consenso? Provavelmente. Teremos também pontos de conflito. Nós não pretendemos
que essa agenda seja uma agenda só de conflito. É uma agenda difícil, mas
achamos que, neste ambiente de construção de responsabilidades comuns,
poderemos encontrar pontos de concordância. Vamos avaliar, ao final desse
processo, as iniciativas que tomaremos. Alguns dizem que a melhor das reformas
é aquela que pode ser feita. Talvez seja importante nós avançarmos naquilo que
é estratégico para o nosso país, preservando direitos constituídos. Vamos
trabalhar com grande sensibilidade os mecanismos de transição, assegurando uma
estabilidade clara e compreensível a toda sociedade dos períodos de transição,
a exemplo de outros países. Todas as eventuais mudanças e aperfeiçoamentos
serão feitos para preservar o modelo de previdência solidária e justa.
"A preservação do salário
mínimo como piso previdenciário importante é uma referência estratégica"
Valor: A expectativa, que surgiu
devido a declarações do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, era de que o
governo apresentasse na próxima reunião do Fórum uma proposta de reforma. Mas o
senhor disse que será definido apenas um cronograma de discussão. O governo
colocou um pé no freio?
Rossetto: Não fui eu que definiu
isso. Foi uma agenda acordada no Fórum. As centrais sindicais e o setor
empresarial discutiram uma agenda de crescimento para o país, que foi enviada à
presidente Dilma. Foi definido também que o governo retornaria ao Fórum, com
uma resposta a essa agenda. Esse é o tema que nós vamos tratar no dia 17. Isso
é público. Ao mesmo tempo, nós acordamos com as centrais sindicais que
debateríamos um cronograma de trabalho para discutirmos uma agenda da Previdência
em dois pontos fundamentais: um diagnóstico e cenários. Nós pretendemos
preparar esse calendário, que será amplo, aberto, e acordar uma metodologia.
Valor: Com prazo?
Rossetto: Com prazo. Este é um
debate que terá começo, meio e fim. A nossa referência é o primeiro semestre.
Valor: Concluir o debate no
primeiro semestre?
Rossetto: Exatamente. Vamos
trabalhar para estabelecer uma agenda clara sobre todos os temas que vão
perpassar essa atualização: os financiamentos, a sonegação, as fraudes, os
benefícios, a idade mínima, o tempo de contribuição, a convergência entre o
regime público e o regime privado, a convergência entre homens e mulheres,
entre rurais e urbanos, as renúncias previdenciárias. O Brasil fez movimentos
contraditórios ao longo dos últimos anos. Nós ampliamos a cobertura
previdenciária, mas retiramos receitas e ampliamos renúncias previdenciárias.
Valor: Esse é o roteiro básico a
que o senhor se referiu?
Rossetto: Sim. Vamos buscar
convergências na perspectiva de preservar, com sustentabilidade, o modelo
previdenciário brasileiro, diante das grandes transformações demográficas que
estão acontecendo na sociedade brasileira, que são bem-vindas.
Valor: Quais são as mudanças?
Rossetto: O Brasil acelera duas
transformações bem-vindas. A população de idosos cresce. Em 2015, as pessoas
com mais de 60 anos correspondiam a 10% da população e em 2030 chegarão a 20%,
com crescimento progressivo. Hoje, o cidadão brasileiro com 60 anos vive, em
média, mais 22 anos e meio. Temos, portanto, uma maior participação de idosos
na população e idosos que vivem mais. Ao mesmo tempo, temos uma segunda reforma
demográfica, que é a redução da taxa de fecundidade. Hoje, a taxa de
fecundidade é 1,74. Com isso, teremos uma alteração naquilo que chamamos de
razão de dependência entre quem trabalha e quem já trabalhou e deve ter a sua
aposentadoria. Essa alteração implica uma avaliação e aperfeiçoamentos. Porque
a base de um sistema solidário e de repartição simples, como é o nosso, quem
trabalha financia quem já trabalhou. Essas contribuições previdenciárias são
complementadas por recursos de impostos, no nosso caso especialmente pela
Cofins e pela CSLL. É esse equilíbrio que vamos avaliar. O equilíbrio entre as
contribuições previdenciárias e os recursos dos impostos que deverão financiar,
com estabilidade, esse novo perfil previdenciário que já começamos a viver e
vamos viver.
Valor: Qual é a sua posição sobre
a idade mínima para requerer aposentadoria?
Rossetto: Nós vamos construir
isso. Todos esses temas estão sendo avaliados pelo governo. O governo não tem
uma posição concluída sobre esse tema.
Valor: Então, quando o ministro da
Fazenda defende uma idade mínima de 65 anos, ele não está falando pelo governo?
Rossetto: Existem várias opiniões
dentro do governo. A opinião do ministro da Fazenda é uma delas. Todas estão
sendo debatidas com responsabilidade, com rigor, de forma a responder a essa
agenda, a essa proposta de reforma da Previdência feita pela presidente Dilma.
Valor: O senhor é contra a reforma
da Previdência?
Rossetto: Não. Sou a favor de um
modelo previdenciário solidário, como o modelo brasileiro, com
sustentabilidade. Um modelo que deve ser permanentemente aperfeiçoado,
preservando direitos e com sustentabilidade financeira. Sou a favor dessa
grande conquista da sociedade brasileira construída a partir da Constituição de
88, que mudou nosso país.
Valor: Existe uma forte
resistência das centrais sindicais ao estabelecimento de uma idade mínima. Elas
preferem a manutenção da fórmula 85/95.
Rossetto: Vamos dialogar com as
centrais e com os parlamentares. Debater sobre nossas experiências do tempo de
contribuição e da idade mínima previstas na Constituição. Também vamos avaliar
aquilo que foi aprovado no ano passado, que é a fórmula 85/95, que combina o
tempo de contribuição e idade.
Valor: O governo pretende igualar
a idade e o tempo de contribuição entre homens e mulheres. Qual sua opinião?
Rossetto: Precisamos verificar se
as razões para se ter essas diferenças se justificam nos dias de hoje. Uma das
razões era a maternidade. Muitas mulheres saem do mercado de trabalho porque a
sociedade imputa às mulheres um trabalho de responsabilidade dos filhos. Nós
vamos avaliar essas condições.
Valor: Qual a experiência
internacional?
Rossetto: Ela caminha no sentido
da convergência. A experiência internacional fará parte da reflexão que vamos
fazer.
Valor: A igualdade de gênero,
então, está na agenda?
Rossetto: A avaliação de condições
diferenciadas para aposentadoria de homens e mulheres fará parte do debate. Do
mesmo jeito que fará parte desta agenda a diferenciação entre trabalhadores
rurais e urbanos.
Valor: Mas é possível equiparar as
regras da previdência dos trabalhadores rurais com os da área urbana?
Rossetto: Tudo isso vamos avaliar.
São condições de trabalho diferente. Temos que entender. A base dessa estrutura
foi definida em 1988.
Valor: As empresas exportadoras de
produtos agropecuários são isentas de contribuição previdenciária de 2,5%. Isso
não é contraditório com um regime sustentável?
Rossetto: É um tema em avaliação.
Valor: A desoneração da folha de
pagamentos também isentou (da contribuição previdenciária) as empresas
exportadoras que optaram pela nova contribuição sobre o faturamento.
Rossetto: Esse desequilíbrio
começou a ser corrigido a partir do ano passado. Nós temos que corrigir
desequilíbrios. Por isso, o tema do financiamento da Previdência fará parte da
agenda.
"A ideia é colocar [a CPMF]
para a seguridade social,
por conta dos temas que envolvem os Estados e municípios"
Valor: Tanto o governo dos ex-presidentes
Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva caminharam na direção de
igualar as regras de aposentadoria dos servidores
públicos com as do INSS. Essa ideia prevalece?
Rossetto: A ideia é buscar
convergência de tal forma que todos os brasileiros participem de um sistema
previdenciário com regras comuns e que seja um sistema justo, adequado.
Valor: As regras que pretendem
estabelecer valerão a partir de quando e para quem?
Rossetto: Todos aqueles que têm
direitos constituídos nas regras atuais terão assegurados seus direitos. Não só
os aposentados como os que já têm condições de aposentadoria. Os direitos
adquiridos estão assegurados. Portanto, não há necessidade de nenhuma corrida,
de antecipação de aposentadoria por conta disso. Haverá um período de
transições frente a eventuais mudanças. Não vai ter truque. Não haverá
surpresa.
Valor: Se ao final do semestre, o
governo não chegar a uma proposta única o que acontece? Não será apresentada
uma proposta?
Rossetto: Nós vamos avaliar a
nossa posição a partir do debate. Um debate para valer depende de
convencimento, argumentos. É um debate para valer. Nós estamos convencidos e
vamos trabalhar para constituição de pontos de convergência.
Valor: A presidente Dilma tem dito
que a reforma da Previdência não tem impacto no curto prazo e que está pensando
no futuro do país. Mas neste ano o déficit da Previdência
Social vai ultrapassar os R$
100 bilhões. O que fazer no curto prazo?
Rossetto: Temos uma agenda de
trabalho em vários níveis. Por exemplo, uma agenda administrativa, que busca
melhoria de gestão e da eficiência, combate à fraude e sonegação. Temos agenda
de mudanças normativas. Quando falamos de 2015, o déficit [R$ 85,818 bilhões]
foi provocado pela queda da receita previdenciária por conta da redução da
massa salarial e da atividade econômica. Foram 1,5 milhão de postos de
trabalho, infelizmente, eliminados. As despesas não estão descontroladas na
Previdência. Ao longo dos últimos anos, preservamos uma necessidade de
financiamento em torno de 1% do PIB. Recuperar no curto prazo é uma combinação
basicamente de recuperação do crescimento econômico.
Valor: Mas não há perspectiva, no
curto prazo, de retomada da economia para ajudar a amenizar o déficit
previdenciário..
Rossetto: Estamos em um cenário
econômico instável. São dificuldades relacionadas a questões internacionais que
se somam às nossas dificuldades internas. Todos os países estão concentrados em
suas agendas econômicas e de superação de um período global difícil. Qual é
minha expectativa para 2016? Que neste ano possamos nos concentrar em agendas
estratégicas para o país e que essa irresponsabilidade de impeachment, que
retirou grande parte da energia política de 2015, seja definitivamente
enterrada.
Valor: O governo também depende da
aprovação da CPMF?
Rossetto: A recuperação da
atividade econômica é a prioridade orientada pela presidente Dilma Rousseff,
geração de emprego e massa salarial. No curto prazo é fundamental a aprovação
da CPMF. Temos muita confiança que ela será aprovada, pois é muito importante
para o país.
Valor: Estão querendo destinar a
CPMF para a saúde?
Rossetto: A ideia em debate é
colocar para a seguridade
social, por conta dos temas que envolvem os Estados e municípios.
Valor: Vai ser preciso mudar a
proposta de emenda constitucional encaminhada pelo governo, que prevê que os
recursos da CPMF serão destinados à cobertura do déficit da Previdência.
Rossetto: Isso. A CPMF é destinada
à Previdência e o debate no Congresso, junto aos governadores e prefeitos,
orienta para uma despesa daseguridade social.
Valor: O senhor é contra
desvincular os benefícios previdenciários do reajuste do salário mínimo?
Rossetto: Sim. Esse é um tema
resolvido até 2019. O Congresso aprovou recentemente, por iniciativa da
presidente Dilma, a politica de valorização do salário mínimo até 2019.
Valor: O tema de desvinculação do
salário mínimo dos benefícios previdenciários não está na agenda da reforma?
Rossetto: Não.
Sem acordo sobre Previdência
CORREIO BRAZILIENSE – DF , CÉLIA PERRONE, 16.02.2016
Divergências
dentro do governo e resistência de políticos da base aliada emperram a reforma
do sistema previdenciário, considerada fundamental para reorganizar as contas
públicas. Fórum criado com o propósito de discutir o tema se reúne amanhã
O governo terá dificuldade de levar adiante a proposta de reforma
da Previdência, apesar do alerta de especialistas de que a medida é fundamental
para colocar as finanças públicas em ordem e garantir a sustentação do regime
de aposentadorias no futuro. Embora tenha prometido avançar na discussão de
regras que impeçam o colapso do sistema, a presidente Dilma Rousseff não
demonstra convicção sobre a necessidade das mudanças. Além disso, enfrenta
resistências na base aliada - que se recusa a encarar a reforma, devido à
impopularidade do assunto - e dentro do próprio Executivo.
Amanhã haverá nova reunião do
Fórum da Previdência, criado no ano passado pelo governo, com a participação de
empresários, estudiosos do tema e sindicalistas, para discutir propostas de
alteração no sistema previdenciário. Mas, enquanto o ministro da Fazenda,
Nelson Barbosa, diz que vai apresentar um projeto, o titular da Previdência,
Miguel Rosseto, que preside o Fórum, afirma que o encontro será apenas para
definir um cronograma de discussão. Entre as propostas defendidas pela área
econômica estariam o estabelecimento de 65 anos como idade mínima para que
tanto homens quanto mulheres possam requerer a aposentadoria. Outra medida
seria a desvinculação dos benefícios do salário mínimo.
Desorganização
"Quando o ministro da Previdência diz que a opinião do colega da Fazenda
é apenas mais uma palavra no debate, é sinal de que o grau de desorganização no
governo chegou ao máximo. Será uma enorme perda de tempo se não houver uma
proposta concreta na mesa", avaliou Fabio Giambiagi, especialista em
finanças públicas e Previdência Social.
"O problema é que colocaram a
raposa para tomar conta do galinheiro. Quando se nomeia um sindicalista para
cuidar de uma matéria que exige um especialista, é difícil chegar a um
acordo", afirmou Renato Follador, consultor que há mais de 30 anos atua na
área de Previdência. Para ele, quanto mais demorarem as reformas, mais o país e
os próprios aposentados pagarão por esse atraso. "A alternativa para
viabilizar o sistema seria criar impostos, coisa que a sociedade não suporta
mais, ou aumentar a contribuição, o que seria inviável também, dado que o
empregador já paga 20% e o trabalhador, mais 11,5% do salário", ressaltou.
Follador diz que é importante
regulamentar a idade mínima e a igualdade de gênero na concessão do benefício,
a exemplo do que acontece em outros países. Também é a favor da desvinculação
do salário mínimo das aposentadorias por causa do impacto que provoca nas
contas públicas. "Salário mínimo regula mercado de trabalho. As
aposentadorias deveriam ser apenas corrigidas pela inflação", frisou.
Ambos os especialistas acreditam
que, sem consenso sobre a necessidade da reforma, a tendência é que ela seja
empurrada com a barriga até que o custo de protelar as mudanças seja superior
ao de enfrentar o problema. "A Previdência vai quebrar o Brasil. A reforma
fica dividida entre direito adquirido e expectativa de direito. Quanto mais
longo o período de transição, melhor para o segurado, mas pior para o
país", definiu Follador.
Desigualdade
O professor Rodolfo Hoffmann, da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que o sistema
previdenciário, sobretudo quando se consideram as aposentadorias do setor
público, reforça a desigualdade de renda no Brasil. "Não é uma questão de
idade ou de gênero que vai resolver. Tudo ajuda, é claro, mas a maior parte dos
rendimentos da previdência são elevados e distribuídos de maneira
injusta." Ele afirma que os 2% brasileiros mais ricos recebem o mesmo
valor, na forma de aposentadorias e pensões, que os 60% mais pobres.
Para economistas, discursos divergentes põem reforma da Previdência
em dúvida
Camilla Veras Mota e Arícia Martins | VALOR
ECONÔMICO – SP ,16.02.2016
Os dissensos entre os ministérios do Trabalho e da Fazenda em
relação à reforma da Previdência são um começo ruim de um debate que deve ser
difícil e que promete uma eventual tramitação conturbada caso siga para o
Legislativo, avaliam economistas. Para muitos deles, a falta de unidade no
discurso do governo levanta dúvidas sobre sua real disposição em levar a cabo
uma reforma sabidamente com elevado ônus político.
Em entrevista publicada ontem no
Valor, o ministro do Trabalho, Miguel Rossetto, afirmou que o governo não tem
posição fechada, entre outros temas, sobre a elevação da idade mínima para a
aposentadoria - para muitos especialistas, o ajuste mais urgente. Rossetto
classificou como opinião pessoal de Nelson Barbosa as declarações do ministro
da Fazenda em defesa da instituição da uma idade mínima de 65 anos.
"A discussão sobre a reforma
começa muito mal. Não sabemos quem está falando pelo partido e quem está
falando pelo governo. O Barbosa não tem ´opinião pessoal´, sua opinião é a de
ministro", ressalta o professor da FEA-USP Luís Eduardo Afonso. O
especialista em Previdência lembra que reformas desse tipo geralmente são
feitas em início de governo, aproveitando o capital político pós-eleições.
O debate atual, pondera, é mais um
desdobramento do problema fiscal, que torna premente a redução de gastos.
"A impressão é que vão sair apenas pequenos remendos, como a cobrança da
contribuição dos exportadores agrícolas", diz, em referência à proposta de
fim da isenção de 2,6% a produtores que vendem ao exterior.
"O ministro Rossetto sempre
foi publicamente contra. Se o governo realmente queria fazer reforma, por que o
nomeou para o ministério?", questiona José Márcio Camargo, economista da
Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio. "Minha avaliação é que o
governo não quer fazer reforma da Previdência. Está tentando jogar para a
plateia e ganhar tempo."
"A reforma já seria difícil
de aprovar no Congresso, dada a fragilidade política e a impopularidade do
governo - sem falar na pressão pelo impeachment -, mas, na prática, vai ser
difícil até mesmo sair uma proposta do governo, em função da falta de
consenso", afirma Rogério Nagamine Costanzi, técnico do Ipea e
ex-funcionário do Ministério do Trabalho.
Para ele, a resistência à
desvinculação dos pisos previdenciários ao salário mínimo, ressaltada por
Rossetto, era esperada. Além de exigir emenda constitucional, o tema sempre foi
rechaçado no PT. Mantida a vinculação, diz, seria necessário rever a política
de valorização do mínimo, fixada até 2019 e insustentável a médio prazo.
O economista-chefe da MB
Associados, Sérgio Vale, avalia que a desvinculação deveria ser uma das
primeiras medidas, em paralelo a uma revisão da própria fórmula de reajuste do
mínimo. "Não há razão para acreditar que a presidente esteja realmente
empenhada nisso, depois de cinco anos ignorando o problema e, na verdade,
piorando a situação. Agora que não há força política nem para aprovar uma
medida que depende de voto majoritário apenas, o que dirá medidas mais duras
como idade mínima".
Para o economista-chefe do banco
Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, as diferenças entre Trabalho e Fazenda
são compreensíveis: os ministérios têm agenda própria. Para ele, é positiva a
busca de consenso via Fórum de Debates sobre Políticas de Emprego, Trabalho e
Renda e de Previdência Social,
que se reúne amanhã.
Afonso questiona a iniciativa,
lembrando o desfecho do fórum instituído com igual propósito em 2007, encerrado
com documentos "vagos" e sem proposta concreta.
Ainda que não acredite em um
avanço prático, Mauro Schneider, economista da MCM Consultores , enxerga como
positiva a retomada da discussão, especialmente se ela for séria. Para ele, a
reestruturação da Previdência é parte de uma necessidade maior de revisão de
uma série de instituições públicas, que diminua a rigidez dos gastos, que
simplifique e torne mais eficiente a arrecadação tributária e que equalize as
distorções causadas pelas concessões de subsídios e benefícios a determinados
setores.
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