Da arte de
engolir sapos, sem coaxar
Por Paulo César Régis de Souza (*) |
Há certas
coisas na Previdência Social brasileira que passam batidas para a maioria dos
especialistas, da mídia, dos políticos, da população e até dos servidores do
Ministério da Previdência Social-MPS e do Instituto Nacional do Seguro Social-INSS.
O ministro
Garibaldi Alves é astuto, hábil, sensato, político e “como bom cabrito não
berra”. Este é seu lado nordestino, potiguar, que lhe deu sucessivos mandatos, liderança
e prestígio.
Certamente é
o único político da atualidade, de todos os partidos da base e extra-base, que
está fazendo um “intensivão” em Previdência Social vivenciando na prática “fatos,
artimanhas, injunções e experiências” na administração do MPS e do INSS, o que
outros políticos nem imaginam que possa ocorrer numa situação normal.
Ele finge que
tudo é normal e que não é com ele.
Aprendeu
desde cedo - além de descascar abacaxi - a engolir sapos sem coaxar para levar
adiante a missão que lhe foi confiada pela Presidente Dilma e pelo seu Partido,
o PMDB.
Recentemente,
no episódio da demissão do Secretário de Política de Previdência Social Dr.
Leonardo Rolim, mais um “sapo” foi engolido.
Claro que
estamos ao lado do Ministro quando postulamos que o MPS deve ter a formulação e
o comando de coordenação da política de Previdência Social, o que lhe cabe
legalmente, mesmo sabendo que esta atribuição constitucional foi usurpada pelo
Ministério da Fazenda “Social” de forma abusiva, atrabiliária, com profundas
repercussões e sequelas no modelo previdenciário construído ao longo de 92 anos
com seriedade, competência, responsabilidade e respeito internacional.
Portanto,
instalou-se uma situação de anormalidade.
O Ministro e
o Ex-secretário apenas verbalizaram o óbvio quando admitiram de público um
crescimento nominal no déficit previdenciário em 2014 (na estrita relação
contábil da apuração do mesmo déficit, seja receita corrente líquida-menos
arrecadação de contribuições sobre folha) com base na evolução das despesas com
pagamento de benefícios. Ambos apenas não previram que suas eventuais
colocações pudessem ferir suscetibilidades e vaidades dos deuses da Fazenda
“Social”, acostumados à manipulação de dados estatísticos que já preocupam o
mercado e as instituições multilaterais, como o FMI e a Comunidade Europeia.
Sem falar que a comunidade acadêmica acendeu a luz vermelha para as alquimias
do superávit primário, financiamento da dívida interna e endividamento da
União, estado e municípios que contaminaram outros indicadores.
O Ministério
da Fazenda “Social” acabou com a receita previdenciária, incorporada
intempestivamente à Receita Federal, e desde então assumiu o comando de
formulação e coordenação da política previdenciária. A ação do MPS e do INSS ficou adstrita à
concessão e a manutenção de benefícios.
Ouvi de um
ex-ministro do governo Lula a afirmação de que se estivesse à frente do Ministério
isto não teria acontecido.
Mas o
desastre maior ocorreria em seguida com a forte ampliação das renúncias de
contribuições previdenciárias (isenção da contribuição patronal), o mais grave
sem contrapartidas efetivas. A Fazenda “Social” ignora que a contribuição
patronal (zerada) financia a aposentadoria do trabalhador e que a conta será paga
pela sociedade.
Depois da
queda, outro coice com a imposição da desoneração da contribuição sobre a folha
que foi um presente para a classe patronal e um ferro para a classe dos trabalhadores
e da própria Previdência Social.
Sei que o
patronato queria o fim da contribuição sobre a folha e não morre de amores pelo
Seguro Social, mas a Fazenda “Social” optou pela desoneração, como instrumento
de política fiscal que é uma violência sobre a qual os trabalhadores não se
manifestaram e aceitaram cabisbaixos, submissos e indiferentes.
Nós da ANASPS
fomos um dos únicos que protestamos, porém em vão.
Estamos
vivendo um momento de descaminhos impostos à Previdência pela Fazenda Social,
que pode custar muito caro ao país caso os segmentos pensantes não reajam às
violações do projeto “Pacto de Gerações” de Eloy Chaves, especialmente agora
quando sistemas previdenciários de todo mundo começam a enfrentar a crise do
crescimento exponencial dos maiores de 70 anos.
O bônus demográfico está se extinguindo e teremos logo o bônus
demográfico que será compartilhado pelas futuras gerações.
A Previdência
Social não pode e não deve ser instrumento de política fiscal. É o grande instrumento de política social,
com contribuição atuarial definida para fins específicos. Tanto é verdade que da
crise de 2008 pra cá foi a Previdência Social que suportou o impacto do
descalabro fiscal e financeiro, mantendo a coesão social.
(*) Paulo
César Régis de Souza é Vice-presidente Executivo da Associação Nacional dos
Servidores da Previdência e da Seguridade Social - ANASPS.
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